30/11/2011

Somos pais e filhos adotivos

Por Marcelo Tas

Ilustração: Ricardo Gimenes

Tenho amigos de várias idades. Já fui testemunha da transformação de muitos deles de solteiros convictos em casados apaixonados e dedicados a seus parceiros e parceiras. Para a grande maioria dos casais que vi surgir, sempre observei com atenção e alegria o momento inevitável da vontade de ter filhos. Nessa hora, algo cada vez mais comum e triste acontece. O planejamento exigente e cuidadoso dos casais, baseados na ilusão costumeira de que eles é que vão escolher com precisão suíça a hora da chegada dos filhos, se transforma em frustração e ansiedade. O ciclo da vida é um eterno mistério. O tempo, esse velho senhor da razão, não para de colocar armadilhas e surpresas no caminho. O relógio biológico sugere que vivamos a vida como se cada batida do coração fosse a primeira. Mas a frase é dificílima de ser colocada em prática.

Queremos ter o controle de tudo. Quando, por alguma razão, os filhos não chegam, há um risco enorme de fadiga na estrutura do casamento. Nem todo casal deve ter filhos, claro. Mas é inegável que a experiência da paternidade e maternidade dá uma consistência especial ao casamento.

Talvez por conta das novas demandas profissionais, o casamento e os filhos são cada vez mais empurrados para um período mais tardio da vida. É doloroso ver casais gastarem preciosas economias e até recursos inexistentes em médicos e métodos de fertilidade tão incertos quanto desgastantes, materialmente e espiritualmente. O outro lado da moeda, compensador, é ver como a adoção passou a ser uma opção que ganha novo valor nos dias que correm. E como correm...

Emocionado, acompanhei o drama de um casal de amigos que, depois de um longo processo de debate, se decidiu por adotar uma criança. Descobriram, a duras penas, que a chegada do filho adotivo apresentava a mesma dificuldade, senão ainda maior, que a do frustrado processo biológico. A chegada do pequeno ser que iluminou a vida deles teve cenas de cinema. Com direito a mergulho na burocracia selvagem e viagens arriscadas a lugares remotos do país.

Apresentei esse mesmo casal, sugerindo-os como consultores, a um outro casal de amigos brasileiros que mora no exterior com o mesmo drama. Novamente, fui testemunha de cenas comoventes e inesquecíveis. O coração deles se abrindo ao constatar, numa visita ao Brasil, o quanto os filhos adotivos (na ocasião já eram dois!) haviam sido incorporados e amados como filhos pelo casal “consultor”. Apenas filhos, sem o adjetivo: adotivos.

Mais recentemente, um outro casal de amigos adotou uma garota com 7 anos! Pude testemunhar como, com o avançar da convivência, do afeto e das inevitáveis crises entre eles, cada um parece ter nascido para o outro. Tanto os “novos” pais pareciam ter recebido a encomenda perfeita para renovar o casamento deles quanto a linda garota, já grandinha e serelepe, ter nascido para encontrar, um dia, aqueles novos pais.

Quero ainda registrar e agradecer a história enviada pela leitora Patrícia Silva, de Jaguariúna (SP), que inspirou esta coluna. Depois de três anos, e muitas incertezas, na fila do Cadastro Nacional de Adotantes, Patrícia relata com coragem tocante a transformação da vida dela e de seu marido, Gil, com a chegada do pequeno Nicolas. Patrícia sugere que o assunto “adoção” seja abordado de forma mais simples e direta para injetar coragem nos outros casais que vivem o mesmo drama dela. Concordo 100% e digo mais: penso que todos os filhos, de uma forma ou de outra, adotam os seus pais e vice-versa. Somos todos pais e filhos adotivos.

MARCELO TAS é jornalista e comunicador de TV. Tem três filhos: Luiza, 22 anos, Miguel, 10, e Clarice, 6. É âncora do “CQC” e autor do Blog do Tas. Aceita com gratidão críticas e sugestões sobre essa coluna no e-mail: crescer@marcelotas.com.br

Daniela Toviansky

24/11/2011

Novo disco do Ultraje?

Após o incidente ocorrido entre parte da equipe técnica da banda Ultraje a Rigor e a do cantor Peter Gabriel no ultimo dia 13 no festival SWU, começaram a surgir parodias em relação ao ocorrido, dentre elas esta uma foto onde mostra a relação entre a banda e o Vulgar Display of Power (clássico disco da banda Pantera).

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Lobão: nova nota sobre o Lollapalooza Brasil

LOBÃO nesta terça-feira (22/11) divulgou uma nova nota oficial em seu perfil no Facebook sobre a sua decisão em não tocar no festival Lollapalloza Brasil e que pode ser lida na íntegra abaixo:

Nota de Esclarecimento

Nossa intenção era que a nota enviada ontem, dia 21/11/2011, para toda imprensa fosse suficiente para esclarecer os fatos que levaram o Lobão a desistir de tocar na edição brasileira do festival Lollapalooza, mas desde então, muitos boatos e atitudes arbitrárias foram tomadas, nos forçando novamente a fazer um comunicado oficial, o qual esperamos que seja claro, objeto e final.

- É de conhecimento que o Lobão gravou um vídeo em que manifesta sua opinião a respeito da forma como os artistas brasileiros vem sendo tratados nos grandes festivais. Conta também sobre a recusa em participar do festival.

Vale deixar muito claro, que a decisão de NÃO PARTICIPAR DO EVENTO foi do Lobão e não o contrário. Portanto, o músico não compreende o comunicado enviado ontem, dia 21/11/2011 pela Geo Eventos dizendo que mantinha o convite feito ao músico, sendo que, no mesmo dia, nossa assessora de imprensa tentou um contato com a GEO Enventos, na intenção de promover uma conversa franca, clara e frente a frente com o músico Perry Farrell, mas até o momento não recebeu nenhum resposta. Essa conversaria colocaria um ponto final em toda a polêmica causada, evitaria boatos e o famoso “disse que disse”.

O CONVITE

O Lobão foi convidado a participar do evento (e se sentiu muito honrado com isso). Seu agente chegou a assinar a carta intenção e o músico - inclusive - iria se apresentar-se por um cachê menor, com condições diferentes do que ele estipula em seus shows, porque tinha em mente a importância de fazer parte do Lollapalooza. Portanto, não teria motivo para desistir se não fosse por uma razão que tanto o músico como sua equipe consideram séria. Em anexo a cartão de intenção,

NÃO SE TRATA DE NACIONALISMO DEMAGOGO

Também é muito importante salientar que não se trata de uma posição bairrista ou mesmo nacionalista demagoga. Lobão é admirador da música e da arte americana, assim como de outros países, muito diferente do pouco conhecimento demonstrado pelo músico Perry Farrell em entrevista para a Folha de São Paulo, em que cita: "Estou aprendendo sobre os brasileiros agora, assim como vocês estão aprendendo agora sobre as bandas internacionais" e arremata dizendo que não conhece a música do Rappa, mas que o vocalista da banda é sexy.

Na mesma matéria Perry Farell deixa claro o pouco conhecimento que tem do cenário brasileiro com a seguinte afirmação: “Espero que o Lollapalooza traga essa cultura de festivais e shows internacionais para a América Latina. Ops, para o Brasil”.

E para finalizar deixa uma dica totalmente equivocada para um músico que tem dezenas de hits, mais de 30 anos de carreira e milhares de discos vendidos ao longo dos anos: “Vou dar um conselho a ele: grave um disco muito bom, um que todo mundo ame, e faça as pessoas quererem vê-lo ao vivo. Então, ele poderá ser headliner de um festival”

O ESPAÇO PARA BRASILEIROS

A questão central não é o horário que havia sido estipulado para o Lobão, mas sim, a forma como os artistas nacionais estavam divididos dentro do festival. Repetindo o que foi dito na nota de ontem: ficou estipulado que o Lobão iria tocar no dia 08 de abril, às 15H. Até então não haveria problema algum, mas, o músico recebeu a informação de que, todos os artistas brasileiros que iriam tocar nos dois palcos principais do festival só poderiam tocar das 10H às 15H e, que horários nobres estavam reservados para os artistas internacionais. Para que não houvesse qualquer tipo de desentendimento, Lobão ligou diretamente para o empresário Sergio Peixoto da GEO Eventos questionando a informação, a qual - infelizmente - foi confirmada.

Foi vendida para o lobão a idéia de que ele seria o artista principal, fechando as atrações brasileiras, como se a tal situação fosse motivo de orgulho, enquanto na verdade para ele é motivo de vergonha.

CONVOCAÇÃO AOS BRASILEIROS

O que Lobão pede é uma recuperação de auto-estima. Até quando o público e a classe artística vão deixar que os empresários e os grandes festivais nos desfavoreçam dessa forma? É uma questão de respeito mutuo, de reconhecimento de nossa arte e interação equilibrada e harmoniosa entre todos os artistas de todos os países.

Não importa se o músico irá tocar às 10H da manhã ou no final da noite, o que se questiona aqui é o pouco valor dado para os músicos brasileiros em geral e para as bandas do nosso mainstream que são tratadas como iniciantes num festival internacional, por sinal, festivais que obviamente estão enxergando que diante da crise mundial, o Brasil é um ótimo lugar para se fazer lucro.

Pagamos caro em ingressos, compramos com meses de antecedência e não estamos dando valor a nós mesmos?

O que Lobão não aceita é que os artistas nacionais sejam colocados como segundo plano e que não sejam tratados com o respeito que merecem. E enquanto o público, a mídia e os próprios artistas continuarem a aceitar isso, o Brasil continuará sendo visto como o país da selva e de terceiro mundo, onde qualquer estrangeiro chega aqui e faz o que bem entende com a nossa música, com o nosso rock n roll.

Os festivais precisam ceder a nós. São eles que precisam da nossa bilheteria, e não o contrário.

Citamos mais uma vez, que nos entristece perceber, se torna mais fácil vender a imagem do Lobão polêmico e lunático do que admitir a situação e dizer que vão corrigi-la.

Com os rumos que as coisas tomaram e principalmente após a entrevista dada por Perry Farrell agora Lobão não tem mais dúvidas de que estava certo quando percebeu que os artistas nacionais não estavam sendo tratados como deveriam.

O músico que estava muito honrado com o convite, infelizmente sente-se frustrado em perceber que atual situação – novamente – não tem servido como motivador para que a classe artística e o público tomem uma atitude em relação ao fato.

Ninguém está fazendo favor aos brasileiros, somos nós que estamos recebendo os grandes festivais aqui, portanto, acreditamos que esta questão seja de imensa importância para que possamos discutir até quando os ARTISTAS e a CULTURA BRASILEIRA serão colocados em segundo plano dentro do próprio país. Nós queremos intercambio musical sim! Admiramos as bandas internacionais, mas queremos o mesmo intercambio dentro do respeito e integridade.

Acreditamos que dessa vez a situação esteja esclarecida e que consigamos dar um passo a frente, tomar uma atitude e mudar para melhor.

Atenciosamente,

Lobão e sua equipe".

01/11/2011

Eu, o SUS, a ironia e o mau gosto

Eu, o SUS, a ironia e o mau gosto

by Nina Crintzs

Há seis anos atrás eu tive uma dor no olho. Só que a dor no olho era, na verdade, no nervo ótico, que faz parte do sistema nervoso. O meu nervo ótico estava inflamado, e era uma inflamação característica de um processo desmielinizante. Mais tarde eu descobri que a mielina é uma camada de gordura que envolve as células nervosas e que é responsável por passar os estímulos elétricos de uma célula para a outra. Eu descobri também que esta inflamação era causada pelo meu próprio sistema imunológico que, inexplicavelmente, passou a identificar a mielina como um corpo estranho e começou a atacá-la. Em poucas palavras: eu descobri, em detalhes, como se dá uma doença-auto imune no sistema nervoso central. Esta, específica, chama-se Esclerose Múltipla. É o que eu tenho. Há seis anos.

Os médicos sabem tudo sobre o coração e quase nada sobre o cérebro – na minha humilde opinião. Ninguém sabe dizer porque a Esclerose Múltipla se manifesta. Não é uma doença genética. Não tem a ver com estilo de vida, hábitos, vícios. Sabe-se, por mera observação estatística, que mulheres jovens e caucasianas estão mais propensas a desenvolver a doença. Eu tinha 26 anos. Right on target.

Mil médicos diferentes passaram pela minha vida desde então. Uma via crucis de perguntas sem respostas. O plano de saúde, caro, pago religiosamente desde sempre, não cobria os especialistas mais especialistas que os outros. Fui em todos – TODOS – os neurologistas famosos – sim, porque tem disso, médico famoso – e, um por um, eles viam meus exames, confirmavam o diagnóstico, discutiam os mesmos tratamentos e confirmavam que cura, não tem. Minha mãe é uma heroína – mãos dadas comigo o tempo todo, segurando para não chorar. Ela mesma mais destruída do que eu. E os médicos famosos viam os resultados das ressonâncias magnéticas feitas com prata contra seus quadros de luz – mas não olhavam para mim. Alguns dos exames são medievais: agulhas espetadas pelo corpo, eletrodos no córtex cerebral, “estímulos” elétricos para ver se a partes do corpo respondem. Partes do corpo. Pastas e mais pastas sobre mesas com tampos de vidro. Colunas, crânio, córneas. Nos meus olhos, mesmo, ninguém olhava.

O diagnóstico de uma doença grave e incurável é um abismo no qual você é empurrado sem aviso. E sem pára-quedas. E se você ta esperando um “mas” aqui, sinto lhe informar, não tem. Não no meu caso. Não teve revelação divina. Não teve fé súbita em alguma coisa maior. Não teve uma compreensão mais apurada das dores do mundo. O que dá, assim, de cara, é raiva. Porque a vida já caminha na beirada do insuportável sem essa foice tão perto do pescoço. Porque já é suficientemente difícil estar vivo sem esta sentença se morte lenta e degradante. Dá vontade de acreditar em Deus, sim, mas só se for para encher Ele de porrada.

O problema é que uma raiva desse tamanho cansa, e o tempo passa. A minha doença não me define, porque eu não deixo. Ela gostaria muitíssimo de fazê-lo, mas eu não deixo. Fiz um combinado comigo mesma: essa merda vai ter 30% da atenção que ela demanda. Não mais do que isso. E segue o baile. Mas segue diferente, confesso. Segue com menos energia e mais remédios. Segue com dias bons e dias ruins – e inescapáveis internações hospitalares.

A neurologista que me acompanha foi escolhida a dedo: ela tem exatamente a minha idade, olha nos meus olhos durante as minhas consultas, só ri das minhas piadas boas e já me respondeu “eu não sei” mais de uma vez. Eu acho genial um médico que diz “eu não sei, vou pesquisar”. Eu não troco a minha neurologista por figurão nenhum.

O meu tratamento custaria algo em torno de R$12.000,00 por mês. Isso mesmo: 12 mil reais. “Custaria” porque eu recebo os remédios pelo SUS. Sabe o SUS?! O Sistema Único de Saúde? Aquele lugar nefasto para onde as pessoas econômica e socialmente privilegiadas estão fazendo piada e mandando o ex-presidente Lula ir se tratar do recém descoberto câncer? Pois é, o Brasil é o único país do mundo que distribui gratuitamente o tratamento que eu faço para Esclerose Múltipla. Atenção: o ÚNICO. Se isso implica em uma carga tributária pesada, eu pago o imposto. Eu e as outras 30.000 pessoas que tem o mesmo problema que eu. É pouca gente? Não vale a pena? Todos os remédios para doenças incuráveis no Brasil são distribuídos pelo SUS. E não, corrupção não é exclusividade do Brasil.

O maior especialista em Esclerose Múltipla do Brasil atende no HC, que é do SUS, num ambulatório especial para a doença. De graça, ou melhor, pago pelos impostos que a gente reclama em pagar. Uma vez a cada seis meses, eu me consulto com ele. É no HC que eu pego minhas receitas – para o tratamento propriamente dito e para os remédios que uso para lidar com os efeitos colaterais desse tratamento, que também me são entregues pelo SUS. O que me custaria fácil uns outros R$2.000,00.

Eu acredito em poucas coisas nessa vida. Tenho certeza de que o mundo não é justo, mas é irônico. E também sei que só o humor salva. Mas a única pessoa que pode fazer piada com a minha desgraça sou eu – e faço com regularidade. Afinal, uma doença auto-imune é o cúmulo da auto-sabotagem.

Mas attention shoppers: fazer piada com a tragédia alheia não é humor, é mau gosto. É, talvez, falha de caráter. E falar do que não se conhece é coisa de gente burra. Se você nunca pisou no SUS – se a TV Globo é a referência mais próxima que você tem da saúde pública nacional, talvez esse não seja exatamente o melhor assunto para o seu, digamos, “humor”.

Quem me conhece sabe que eu não voto – não voto nem justifico. Pago lá minha multa de três reais e tals depois de cada eleição porque me nego a ser obrigada a votar. O sistema público de saúde está longe de ser o ideal. E eu adoraria não saber tanto dele quanto sei. O mundo, meus amigos, é mesmo uma merda. Mas nós estamos todos juntos nele, não tem jeito. E é bom lembrar: a ironia é uma certeza. Não comemora a desgraça do amiguinho, não.