30/05/2011

Três décadas ultrajantes

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No rock nacional, longevidade é pra poucos, e os merecedores de uma biografia, menos ainda. Roger Moreira e seu Ultraje a Rigor já figuravam no primeiro panteão, e há poucas semanas ingressaram no restrito clubinho dos que têm a trajetória narrada em livro. Nós Vamos Invadir Sua Praia (Editora Nova Fronteira), da jornalista Andréa Ascensão – um relato detalhado e muito bem ilustrado -, chega em boa hora. Prestes a completar três décadas de vida, a banda brasileira que melhor soube usar o humor pra radiografar os costumes e a sociedade nos anos 80 e 90 vive a expectativa de figurar no talk show do humorista Danilo Gentili, com estreia marcada pra junho, e de lançar um CD/DVD ao vivo no fim do ano.

Pra falar sobre isso tudo e um pouco mais, “Orelhada” ficou meia hora na linha com Roger. Um papo que você lê a partir de agora.

É o momento certo pra lançar a biografia do Ultraje?
Roger Moreira – Eu sou só o biografado, não tenho nada a ver com o lançamento, a escolha da data… Dei várias entrevistas pra Déa, faz anos que ela começou  com isso. Sei lá se é o momento certo ou não (risos). Mas fico contente que tenha saído.

Lendo o livro, olhando pra trás, como você avalia a trajetória da banda?
Roger
– Foi extremamente bem-sucedida. Nossa intenção era só tocar na noite, barzinho, não tinha nenhuma pretensão muito grande. Tinha a vontade, mas só como um sonho, praticamente. A gente foi indo, meio sem querer. Começamos a compor, meio por influência do Edgar (Scandurra). Apesar des ser um banda de cover, a gente não era fiel aos originais, fazíamos dos nosso jeito, um pouco mais pesado, mais rápido e sempre meio avacalhado. Como banda de cover, acabávamos não conseguindo emprego por causo disso. Já tinha, na época, uma certa panela, umas três ou quatro bandas que se revezavam nos bares de cover  aqui em São Paulo. Então a gente partiu pra esse outro lado, de compor. Quando nos demos conta, começamos a conhecer outras bandas, vimos que tinha um movimento.. Enfim, a gente foi só indo e deu no que deu.

Pra uma banda cover, até que vocês foram longe.
Roger
- É verdade (risos). Eu cheguei a dar uma entrevista logo depois de lançarmos o primeiro compacto e perguntaram quanto tempo eu achava que iria durar a banda. Falei: “Ah, uns cinco anos”, que é o quanto duravam as bandas.

Te surpreende ver que o Ultraje tá entrando na quarta década de vida?
Roger
– A gente completa 30 anos no dia 31 de outubro, que consideramos nosso primeiro show. É, surpreende muito. E não só isso, as músicas continuam atuais, a gente continua ganhando fãs, filhos, até netos de fãs antigos. O fato das letras durarem muito não me surpreende tanto porque eu tinha essa preocupação ao fazê-las. As músicas de que gosto são assim, atemporais, então eu não queria falar sobre algo passageiro e escolhi assuntos um pouco mais perenes. Mas, mesmo assim, pô… (risos).

O que você sente quando falam que Nós Vamos Invadir Sua Praia (o disco) é um clássico do rock nacional?
Roger
– Fico muito orgulhoso. Várias vezes, depois desse disco, tive que lutar com isso. É um orgulho tremendo, mas também também é um peso gigantesco. As pessoas esperam algo no mesmo nível. A gente não pensou “vamos fazer o melhor disco de rock”. A gente só foi fazendo as músicas, juntamos as melhores e lançamos o disco. Conseguimos, inclusive, quebrar um tabu com o “Sexo!”, nosso segundo disco. Quando um artista estourava o primeiro disco, normalmente ele fracassava no segundo.

Por quê a formação da banda muda tanto?
Roger
– O pessoa pergunta muito isso. Por mim, teria ficado sempre com a mesma formação, desde o Edgard.

Vi no site da banda fotos em que vocês aparecem como trio…
Roger
– Tem mais um integrante, que entrou faz dois anos, ele já tinha tocado comigo na Fabulosa Orquestra de Rock’n'roll, um projeto paralelo que eu tinha. É um amigo nosso, tá supergostoso agora. O Mingau e o Marcos Kleine têm outra banda, que se chama Vega, o Bacalhau teve outro banda e agora não tem mais… Enfim, cada um tem seus projetos. Eu só tenho o Ultraje e não posso segurar todo mundo na banda. Se o cara quer sair, sai.

Acho que não existe um período do rock brasileiro tão biografiado quanto os anos 80. Ao que se deve isso?
Roger
– Os anos 80 foram pra nós mais ou menos como foram os anos 50 para os americanos. Pra eles o pós-Segunda Guerra foi um período meio sombrio, de recessão, e sentiram essa necessidade de mudar e tal. Pra nós, os anos 80 vieram depois da ditadura. E não foi só na música – foi nos programas de TV, nos cartuns, livros, teatro… Foi muita coisa que tava reprimida e veio à tona. Na parte de música, principalmente, a juventude não tinha ídolos que a representasse. A gente já tinha público, já tinha fãs, e aconteceu de as gravadoras irem atrás da gente. Acho que todos nós eramos muito idealistas. As bandas não tinham parâmetros, não tinha MTV, nadávamos contra  a corrente mesmo. E cada banda tinha o seu estilo. Em comum, tinham essa vontade de falar direto pra nossa geração.

O que você acha que pode render a chegada dessa biografia?
Roger
– Não sei se o livro vai ser comprado por gente mais velha – gente da minha geração que viveu aquilo, que gostaria de saber mais sobre a gente, ou recordar – mais do que por gente mais jovem que tem acesso à internet e pergunta direto pra mim. E como eu te disse, não é um lançamento nosso, não tenho nenhuma estratégia pra isso. A gente tá gravando o programa do Gentili, que provavelmente vai repercutir mais do que a biografia ou até mesmo alavancar as vendas dela.

Em 2009, vocês lançaram um EP virtual. Como você avalia a experiência?
Roger
– Teve bastante gente que baixou as música, mas ainda é um pouco insipiente, e isso vindo de uma pessoa que tem uma carreira, uma história. Acho que se um Luan Santana ou Restart lançasse algo, teria mais respaldo, mas ainda assim porque são populares nas mídias tradicionais. De qualquer forma, acho que é o futuro. A nossa idéia não era fazer sucesso com esse lançamento, era apenas prover uma demanda que tinha dos fãs e aproveitando essa tecnologia de poder gravar aqui em casa, no iphone, e colocar pra download.

O que vocês estão preparando agora?
Roger
– Este ano vamos lançar um DVD ao vivo, que deve vir acompanhando de um CD. Tem esse programa, que estreia em junho… Acho que tá bom (risos).

Há muito tempo você compôs “Nada a Declarar”, que falava sobre acomodação da juventude e a mediocridade musical. Minha impressão é que o cenário tá ainda pior, em termos de mainstream. Qual a sua opinião?
Roger
– Tem muito isso de buscar a celebridade sem ter um porquê. Tá mais descartável ainda. Tem gente que de repente estoura e some dois, três anos depois. As gravadoras estão, de certa forma, falidas, espremendo o bagaço. Os artistas se revezam na mesma rapidez por causa disso, ou porque simplesmente querem ser famosos e fazem qualquer negócio por isso, o que não garante uma carreira.

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