"Monster", vigésimo disco da longa carreira do Kiss, é um álbum
surpreendente. Surpreendente porque não traz nada que remeta aos
trabalhos recentes do quarteto liderado por Gene Simmons e Paul Stanley.
Não há uma produção grandiosa e canções feitas descaradamente sob
medida para virarem singles, e nem mesmo o hard festivo executado pelo
grupo durante a década de 1980. A história aqui é outra.
Em "Monster" o
Kiss embarcou em uma máquina do tempo e fez uma viagem de volta aos anos
1970 - sem escalas, diga-se de passagem. O resultado dessa jornada é um
belo álbum de hard rock puro e sem frescuras, como há um bom tempo a
banda não gravava e como há tempos os fãs esperavam ouvir.
Produzido por Paul Stanley e
Greg Collins, que já havia trabalhado com o grupo no disco anterior,
"Sonic Boom" (2009), "Monster" surpreende pela agressividade e pela
crueza do som. Gene Simmons declarou que o álbum seria uma mistura entre
"Destroyer" (1976), "Revenge" (1992) e "Sonic Boom". Sinceramente, não
consigo perceber elementos dos trabalhos da década de 1990 e 2000 aqui.
Já em relação a "Destroyer", o buraco é mais embaixo.
Gravado
com equipamento totalmente analógico, "Monster" transparece uma
autenticidade e uma diversão que contagiam o ouvinte. É um disco de rock
básico com tudo que se tem direito, e nada além disso. E é justamente
por ser assim que é tão legal. Com canções baseadas em riffs, refrões
ganchudos e energia de sobra, "Monster" mostra um Kiss renovado e com o tanque cheio de um combustível de alta octanagem.
Um
dos responsáveis por esse entusiasmo e dinamismo é o guitarrista Tommy
Thayer. O músico por trás do papel que um dia já foi de Ace Frehley
brilha em todo o disco, principalmente nos solos - ouça “Wall of Sound” e
“The Devil is Me” e comprove. O outro é Paul Stanley. Além da produção,
Stanley coloca-se levemente à frente de Gene Simmons em todo o álbum,
ditando as regras e assumindo o controle. Das doze faixas, Paul canta
cinco, Gene quatro, Tommy uma (“Outta This World”), Eric Singer outra
(“All for the Love of Rock & Roll”) e os dois integrantes originais
dividem o vocal em “Take Me Down Below”.
Antes da gravação e
durante o processo de composição, Stanley declarou que em "Monster" a
banda teria mais liberdade artística. Isso, ainda que perceptível, é um
tanto estranho para uma banda do tamanho e com o status do Kiss.
Afinal, se eles não possuem liberdade artística, quem possuirá? Nas
entrelinhas, porém, a leitura é outra. O sucesso de "Sonic Boom", que já
apresentava um som mais simples e uma produção menos grandiosa que a
habitual, fez Gene perceber que o caminho proposto por Stanley estava
correto. Essa “liberdade artística” citada por Paul pode ser
interpretada como uma cobrança menor de Gene por resultados, deixando
Stanley trabalhar na boa. E como toda pessoa mais entendida na história
do Kiss
sabe, o direcionamento artístico da banda sempre veio, em grande parte,
da visão de Paul, enquanto Gene fazia o seu papel com maestria na outra
ponta, construindo uma das marcas mais conhecidas do rock e erguendo um
dos maiores impérios da indústria musical.
"Monster" é bastante
homogêneo e nivelado por cima, mas algumas canções se destacam um pouco
mais do que as outras. É o caso de “Hell or Hallelujah”, “Wall of
Sound”, “Back to the Stone Age”, “Shout Mercy” e “Last Chance”. Merece
menção também a incrível semelhança entre “Long Way Down” e a clássica
“Shapes of Things” na versão gravada pelo Jeff Beck Group em seu álbum
de estreia, "Truth" (1968). Se é uma homenagem ou uma inspiração, não se
sabe, mas o resultado ficou legal.
Concluindo, o Kiss
mostra em "Monster" que ainda é relevante. Polindo os excessos e
focando em uma sonoridade mais crua e direta, o quarteto mascarado
gravou um disco bastante agradável e que cairá no gosto não apenas dos
fãs. Como diriam os Stones: it’s only rock and roll, but I like it!
Faixas:
Hell or Hallelujah
Wall of Sound
Freak
Back to the Stone Age
Shout Mercy
Long Way Down
Eat Your Heart Out
The Devil is Me
Outta This World
All for the Love of Rock & Roll
Take Me Down Below
Last Chance